Em 2006, quando ainda morava em São Paulo, fiz seis meses de aula de flamenco. Cheguei a aprender a dançar uma pequena sevillana inteira. O amor pelo flamenco foi à primeira vista. Talvez porque posso dançar sozinha. Ou porque a dor das músicas que embalam a dança não são puxadas de um lugar de tristeza, mas de força. As mulheres que dançam flamenco são fortes. As que cantam também. É o caso de Mayte Martín, cuja música descobri há três anos, quando morava em Camillus, NY. Estava voltando da universidade onde trabalhava quando o algoritmo do Spotify me depositou "Por la Mar Chica del Puerto" no carro. Ouvi a canção no repeat até chegar em casa. Passei meses ouvindo todos os discos dela. Nessa semana, Mayte voltou ao meu algoritmo. Só então percebi que o disco dela de que mais gosto - "Al Cantar a Manuel" - não canta só o flamenco, mas também a poesia. Nele, Mayte canta os poemas de Manuel Alcántara, jornalista e poeta espanhol, no ritmo e na dor do flamenco. "Por la Mar Chica del Puerto" e todas as outras músicas do disco nasceram como poemas. Todos podem ser lidos neste livro belíssimo de Alcántara, que reúne outros poemas, como o abaixo, um dos meus preferidos. Soneto para acabar un amor He quemado el pañuelo, por si acaso se pudiera tejer de nuevo el lino. Le sobra la mitad del vaso al vino y más de media noche al cielo raso. Tenía que pasar esto. Y el caso es que estando yo siempre de camino y estando tú parada, no te vi y no me ha cogido el amor nunca de paso. Puede que salga a relucir la historia porque nunca se acaba lo que acaba, que se queda a vivir en la memoria. Echa a andar el amor que te he tenido y se va no sé dónde. Donde estaba. De donde no debiera haber salido.
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AuthorBeatriz Rey is a political scientist and a writer based in Washington, D.C. Archives
February 2023
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